RESTAURAÇÃO E SIMILARES - ANSIÃO -REUNIÃO: DIA 3 DE JULHO COM PRESENÇA DA ASAE.

 

A PROPÓSITO DA SESSÃO QUE VAI TER LUGAR EM ANSIÃO, DEIXAMOS UMA ENTREVISTA RECENTE SOBRE A ACTUAÇÃO DA ASAE, PUBLICADA NO JORNAL DE LEIRIA.

 

António Nunes,

presidente da ASAE

-“Fazer cumprir a lei não é ser fundamentalista”

 

 

A Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica é, por vezes, acusada de ser fundamentalista e de estar a pôr em causa algumas tradições do País. Como comenta?
A ASAE não é entidade reguladora nem normalizadora. Nem sequer aplica coimas. A ASAE só tem a ver com a fiscalização. Fazer cumprir a lei não é ser fundamentalista. A questão que se coloca é que a legislação no âmbito alimentar é sobretudo comunitária e alguns países saem a perder com a aplicação das normas. Mas o que é preciso é perceber se o consumidor ganha ou perde com estas normas. Julgo que ganha. A ASAE apenas fiscaliza se a lei está a ser cumprida. Se há tradições que estão a ser colocadas em causa, há organismos a quem compete fazer essa defesa. Não aceito essa acusação de fundamentalismo. Se há uma norma, ela tem que ser cumprida. Até à existência da ASAE, provavelmente, havia uma condescendência na aplicação das normas completamente diferente.

A ASAE não é condescendente....
A ASAE não tem que ser condescendente. Só tem que verificar se a norma está ou não a ser cumprida, em nome da defesa dos consumidores, em primeiro lugar, e da regulação das actividades inter-sectoriais, em segundo. Quando somos exigentes para todos ao mesmo nível, queremos que a concorrência se faça de forma salutar. Se assim não for, um operador que não cumpra as regras de licenciamento, de congelação, ou outras, pode vender produtos a preços mais económicos que aquele que cumpre a legislação.

As operações da ASAE são bastante mediatizadas e até aparatosas. Esta é uma estratégia para dissuadir os infractores?
Pode dizer-se que sim. Uma das vertentes da acção da ASAE é a actividade informativa, que acaba por ser de prevenção. Com aquela divulgação, os operadores que não foram sujeitos a determinada operação ficam informados. E podem colmatar a sua falta de conhecimento, que aceito que exista. Muitos operadores, de forma distraída, uma pouco à portuguesa, adiam durante semanas ou meses, para não dizer anos, as actualizações que devem fazer. A informação pública que prestamos acaba por dar a conhecer aos consumidores que há um organismo do Estado para os defender. E os operadores ficam a saber que, amanhã ou depois, as brigadas irão ter com eles.

 

As acções desenvolvidas têm tido efeitos práticos? Nota-se uma diminuição no número de infracções?
Vou apontar o único caso do qual temos dados. Em 2006, fomos no 13 de Maio a Fátima e levantámos cerca de 290 autos de contra-ordenação. Este ano voltámos e levantámos apenas 30. Ou seja, num ano, o 'estado da arte' ficou completamente diferente. Fizemos duas reuniões nesta localidade, com um conjunto vasto de associações comerciais, que informaram os associados, e as entidades autárquicas, que também fizeram acções que permitiram diminuir aquele número. Os peregrinos que vão a Fátima têm hoje melhores condições de consumo que há um ano.

Essa operação nas vésperas do 13 de Maio foi criticada pelos empresários locais devido ao aparato e à data. Reconhece legitimidade nestas queixas?
Não, por duas razões. A primeira é que só posso ir a Fátima na altura em que há movimento adicional. Caso contrário não estou a fazer prevenção. Ir em Dezembro não faz sentido nenhum. Há um conjunto de problemas que só se podem ver naqueles momentos. Encontrámos produtos cujo prazo de validade ia expirar na altura. Aquela era uma oportunidade para os escoarem. Esta acção entra num critério que temos, que é ir a todos os locais sempre que há uma aglomeração de pessoas. Fátima só tem dimensão para ter uma operação de envergadura quando há peregrinações. O problema foi a surpresa da primeira operação. As outras que fizemos foram iguais, mas já ninguém protestou. Também não me parece que tenha havido outro aparato que não o decorrente do facto de termos ido com 50 brigadas (100 pessoas). Se tenho dois dias e meio para ver tudo, não posso ir com uma brigada. Os operadores não acreditaram quando, antes, dissemos que iríamos a todos os locais onde houvesse aglomerações. Esqueceram-se que as há em Fátima.

Quais foram na altura os principais problemas encontrados?
Vimos situações higieno-sanitárias e técnico-funcionais complicadas e estabelecimentos sem licenciamento, entre outras. Já fomos ao local três ou quatro vezes e hoje o panorama é completamente diferente. Os operadores fizeram um grande esforço e actualmente Fátima é um local onde o consumidor pode estar tranquilo porque as normas estão a ser aplicadas.

A nível nacional, quais as principais infracções que têm detectado?
Variam muito, consoante se trate da área alimentar ou não alimentar. Na restauração e bebidas continuamos a encontrar infracções como falta do livro de reclamações, o que é absolutamente inadmissível, falta de avisos de venda de bebidas a menores ou venda de tabaco, preçário não afixado e também algumas faltas de licenciamento, não por falha das autarquias ou outras entidades, mas porque o próprio operador se desinteressa do processo, que é burocrático. O problema da congelação, que nos preocupa, é outra das vertentes. Muitas vezes fazem-se congelações indevidas, como se os produtos fossem para consumo doméstico. Também ainda há falhas higieno-sanitárias, nem sempre porque os produtos estejam mal, mas porque as cozinhas acumulam gorduras ou poeiras.

 

 

Na área da restauração e bebidas continuam a encontrar situações chocantes?
Basta lembrar o que se verificou há cerca de 15 dias num restaurante da zona da Figueira da Foz, onde conviviam frangos, gatos, cães e ratos. A dona achava que estava tudo bem. Mas devo dizer que isto é marginal, não é normal que aconteça. A taxa de incumprimento na restauração e bebidas anda entre os 15 e os 18 por cento. Há um ano andava na ordem dos 25, 30 por cento. Isto vem legitimar a nossa forma de actuação. Se a ASAE não tem sido exigente no cumprimento rigoroso do que está escrito, provavelmente estávamos ainda a discutir a aplicação da lei.

Garante aos portugueses que podem frequentar com segurança os restaurantes?
Não posso garantir isso. O que posso dizer é que os nossos actos de fiscalização nos têm revelado que a maioria cumpre a legislação. Não encontramos muitas situações de suspensão. O ano passado vimos 20 mil estabelecimentos e suspendemos 520. A suspensão não é a norma, mas a excepção.

Disse recentemente numa entrevista que a cadeia McDonald's é a melhor do ponto de vista higieno-sanitário. Quer concretizar?
Fomos convidados por um órgão de comunicação social a fazer um programa a explicar os cuidados de manipulação nas cozinhas. Fomos exigentes e quisemos começar num local onde todas as condições técnico-funcionais estivessem expressas. Os inspectores correram quatro ou cinco cozinhas e acabaram por ter que ir a uma daquela cadeia de fast-food. Numa organização supra-nacional é mais fácil o cumprimento da regulamentação, porque tem uma capacidade económica diferente para encontrar o apoio técnico necessário. E aplica uma maior exigência aos fornecedores dos produtos.

Público “gosta de feiras e de comprar produtos ilegais”
A área económica é outra das vertentes da actuação da ASAE. Tem havido também uma diminuição das infracções?
Quando falamos de contrafacção há sempre infracção. Normalmente, nesta área estamos perante crimes. São situações de economia paralela, onde não se cumprem as regras. Também verificamos licenciamentos de pedreiras e alguns equipamentos e produtos para a construção civil. De tudo isto, o que tem mais visibilidade são as acções nas feiras, porque interferem com o público em geral, que gosta das feiras e até de comprar os produtos ilegais.

O que acontece aos produtos apreendidos?
Tratando-se de produtos alimentares, a maioria é destruída. Quando são passíveis de ser recondicionados, depois de vistos por médicos veterinários são doados ao banco alimentar, transformados em farinha ou vão para abate sanitário. No caso da contrafacção, os produtos são quase sempre destruídos por ordem dos tribunais. Não é possível aproveitá-los devido às marcas apostas nos mesmos. Se não tiverem a marca visível, cortam-se as etiquetas e doam-se.

 

A quanto ascende o valor do material apreendido?
O ano passado, no total, ascendeu a 18.9 milhões de euros. Este ano já vamos em 36.9 milhões de euros.

Estes números mostram o peso da economia paralela em Portugal...
Sim, mas se fizéssemos mais acções, mais apreenderíamos. Sabemos que o movimento é muito lucrativo, as margens de comercialização são muito grandes, apesar do preço dos artigos corresponder muitas vezes a apenas dez por cento do preço do produto original. Fiscalizamos muito nesta área por três razões, a primeira das quais é fazer cumprir a lei. Depois, porque muitas vezes as marcas imitadas deixam de fazer investimentos no nosso País, porque o mercado paralelo é muito elevado. A terceira razão prende-se com a disciplina do mercado. Se as autoridades não actuam, dá-se uma inversão e quem está a prevaricar consegue ter lucros acima daqueles que desenvolvem a actividade de forma regular.

Para este ano, quais as áreas prioritárias e qual o número de inspecção a realizar?
Prevíamos fiscalizar 34 mil operadores este ano, mas no final deste mês ficaremos já muito próximo do planeado, pelo que deveremos ultrapassar substancialmente aquela meta. Para o próximo ano estão previstas 44 mil acções. Vamos continuar com a política definida, que assenta em acções de defesa do consumidor, livre concorrência e saúde pública. Para isso, iremos a locais de grande concentração, sítios onde se sabe que há venda ilícita e também às actividades que merecem maior atenção a dado momento. Agora são as gelatarias, estabelecimentos de carne, peixe ou vegetais, por exemplo. Estamos na época dos casamentos nas quintas, onde iremos actuar. Se alguém tem alguma dúvida, não tenha, porque vamos lá estar. Na área económica, iremos a grandes obras, onde há sempre tendência para a introdução de produtos que, à vista desarmada, parecem iguais.

Qual o principal problema encontrado nas quintas de casamentos?
Quintas sem licenciamento ou onde haja empresas de catering não licenciadas, obviamente serão alvo da nossa actuação. Mas o principal problema que temos encontrado nem são as instalações, por vezes paradisíacas, mas a água. Muitas quintas têm água própria, de furos, mas não fazem as análises necessárias e lavam alimentos, cozinham e fazem gelo com água contaminada. Por isso já tivemos que suspender a actividade em várias quintas.

Além dos vossos critérios, que outros atendem? Recebem muitas denúncias?
O ano passado, a ASAE recebeu 46 mil reclamações dos livros de reclamações. Algumas não têm pés nem cabeça, mas outras são indícios. Olhamos para elas para escolher sectores e operadores a analisar. Depois há as queixas, sete mil o ano passado. Também vemos com atenção o que sai na comunicação social.

 

Por que é que os inspectores vão encapuzados, sobretudo às feiras?
Não vão tão encapuzados quanto se diz. Quando vamos a uma feira, entre 100 pessoas, haverá nove ou dez encapuzados. A estas juntam-se elementos da PSP ou GNR, que normalmente vão connosco e têm feito um trabalho meritório, pela segurança que têm permitido. No que diz respeito à ASAE, a questão que se coloca é a da segurança das pessoas. Tenho inspectores que vivem em Leiria. Acha que podem ir à feira de Leiria, um ambiente hostil? Porque é hostil, se não fosse não precisávamos de levar forças de segurança. É evidente que os operadores não ficam satisfeitos com a apreensão dos produtos e já têm cumprido ameaças. É normal que as pessoas que vivem na zona vão protegidas, por uma questão de segurança. Por outro lado, se formos todos muito conhecidos, qualquer dia não podemos ir a feira nenhuma, porque antes de chegarmos já fomos detectados.

Leiria tem uma actividade económica pujante, mas o senhor reconhece que a ASAE não tem actuado tanto como gostaria....
Actuamos em Leiria, mas temos que ir propositadamente. O que quero dizer é que, sendo hoje uma área com uma actividade económica muito preponderante, e em expansão, devíamos estar mais presentes. Mas temos que distribuir os nossos inspectores por todo o território e Leiria, sendo tomada em consideração, não tem atenção permanente, como Lisboa ou Porto.

Precisa de mais inspectores?
Não. A maioria das vezes as organizações não precisam de mais, mas de melhor. Claro que se tivesse mais podia ver mais agentes económicos. Mas para as metas que o Governo fixou, o número de inspectores – cerca de 320 – é razoável. Não podemos ter um inspector em cada local. A nossa filosofia é que os inspectores não são das regiões, mas da ASAE. Quando tenho necessidade de pessoas no Algarve, são deslocadas, seja de Mirandela seja de Lisboa. Claro que isto tem custos de deslocação e implica sacrifícios dos inspectores.
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O inspector que diz sempre o que pensa
Licenciado em Economia, António Nunes é presidente da ASAE desde a sua entrada em funcionamento, em 2006. Antes, esteve quase cinco anos à frente da Direcção Geral de Viação. Com 52 anos, tem um vasto currículo na área da Protecção Civil, tendo sido presidente do Serviço Nacional de Protecção Civil e inspector superior dos bombeiros durante vários anos. Presidiu ainda à primeira comissão instaladora da Agência para a Qualidade e Segurança Alimentar. À frente de uma instituição que tem percorrido o País de lés a lés para verificar o cumprimento da lei, António Nunes reconhece ter muito pouco tempo livre. Quando o tem, gosta de ler, ouvir música, ir ao cinema ou passear. Pragmático e frontal, admite que diz sempre o que pensa. “Quando tenho oportunidade falo frontalmente. Não sou capaz de dizer uma coisa e estar a pensar outra.”
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IN jornal de leiria.


publicado por AEDA às 21:11 link do post | favorito